Thursday, 3 December 2009

As mulheres árabes de Israel não precisam sequer de se candidatar a um emprego

É a discriminação e não as especificidades culturais que mantém as famílias árabes na pobreza


por JONATHAN COOK
Em Nazaré

tradução: equipa Todos Por Gaza

Na semana passada, o Ministro das Finanças israelita foi acusado de tentar desviar as atenções das politicas discriminatórias que mantém muitas das famílias árabes do país na pobreza, colocando a culpa para os seus problemas económicos naquilo que descreveu como a “oposição da sociedade árabe ao trabalho feminino”.

Um relatório recente produzido pelo Instituto Nacional de Segurança mostra que metade das famílias árabes em Israel são consideradas pobres comparadas com 14 % das famílias judias.

Yuval Steinitz, Ministro das Finanças israelita, disse durante uma conferência sobre a discriminação no emprego, realizada este mês [novembro] que a falha das mulheres árabes em se tornarem parte da força de trabalho tinha um impacto negativo na economia de Israel. Só dezoito por cento das mulheres árabes estão empregadas, e dessas, apenas metade a tempo inteiro, enquanto que pelo menos 55 % das mulheres judias trabalha.
O ministro atribuiu a baixa taxa de emprego entre esta minoria a “obstáculos culturais, estruturas tradicionais e à crença que as mulheres árabes devem permanecer nas suas cidades de origem”, dizendo ainda que estas restrições são características de todas as sociedades árabes.
Contudo, há investigadores e associações de mulheres que sublinham que o numero de mulheres árabes em Israel é mais baixo do que em quase todos os outros países do mundo árabe, incluído aqueles onde os números do emprego feminino são uma mancha, como sucede na Arábia Saudita e Omã.
“A maior parte das mulheres árabes quer trabalhar, incluindo um grande número de licenciadas, mas o governo tem recusado abordar os vários e grandes obstáculos que lhe têm aparecido no caminho” disse Sawsan Shukhra, da associação Mulheres contra a Violência, uma associação com base em Nazaré.
Esta afirmação é confirmada por um inquérito realizado este mês e que revela que 83 % dos homens de negócios israelitas nas principais profissões (incluindo publicidade, direito, banca, contabilidade e media) admitiram ser contrários à ideia de contratar licenciados árabes, independentemente do seu sexo.

Yousef Jabareen, um urbanista da Universidade Técnica de Technion em Haifa, que realizou um dos maiores inquéritos sobre o emprego das mulheres árabes em Israel, disse que os problemas que estas enfrentam são únicos.
“Em Israel enfrentam uma dupla discriminação, por serem mulheres e por serem árabes” disse.
A média de emprego feminino no mundo árabe é cerca de 40&. Só em Gaza, na Cisjordânia e no Iraque (onde se vive em circunstâncias excepcionais, é que encontramos taxas de emprego entre as mulheres árabes mais baixas do que em Israel.

Jabareen acrescentou que uma série de factores funcionam como obstáculos para as mulheres árabes, entre os quais políticas discriminatórias aplicadas por sucessivos governos para prevenir que a minoria árabe de 1.3 milhões, que constitui cerca de um quinto da população do pais, usufruísse de qualquer tipo de desenvolvimento económico. Estas medidas incluem discriminação generalizada nas políticas de contratação quer no sector privado quer no público, um fracasso em construir zonas industriais e fábricas perto das comunidades árabes, falta de serviço público de apoio à maternidade, quando comparado com aquele que é providenciado às comunidades judias, falta de transportes nas áreas árabes que impedem as mulheres de se deslocar a lugares onde há trabalho e falta de cursos direccionados para as mulheres árabes.

De acordo com um estudo efectuado pela associação Mulheres contra a Violência, 40 por cento das mulheres árabes detentoras de um grau académico não conseguem arranjar emprego. Aquando da entrevista, Mr Jabareen disse que 78% das mulheres desempregadas culpam a falta de oportunidade de emprego pela sua situação.
Maali Abu Roumi, de 24 anos, da cidade de Tamra no norte de Israel, tem procurado emprego como técnica de trabalho social desde que acabou o curso há dois anos. Um relatório elaborado por Sikkuy, uma organização que promove a igualdade cívica em Israel, revelou este mês que a população árabe de Israel recebe cerca de menos 70% de ajuda governamental para serviços sociais do que a população judia, e que os técnicos de serviço social árabes (numa profissão mal paga e que atrai maioritariamente mulheres) tinham uma carga de trabalho superior em 50%.
Maali Abu Roumi disse também que, para além disso, escolas Arabes, ao contrário das escolas judias não podem empregar um trabalhador social porque não têm dinheiro, e que a minoria árabe de Israel não usufruía das instituições de assistência social fundadas por judeus de outros países que ofereciam trabalho a muitos técnicos sociais judeus. “ A maior parte dos judeus com quem estudei já encontraram emprego, enquanto que muito poucos dos árabes do meu curso o conseguiram” disse. “quando um trabalho aparece, é geralmente em part-time e há sempre dúzias de concorrentes”.
O Centro de Planificação Alternativa, uma organização árabe que estuda o uso da terra em Israel, informou que em 2007, apenas 3.5 por centro das zonas industriais do país estavam localizadas em comunidades árabes. A maior parte atraia apenas pequenos negócios como oficinas de reparação de carros ou de carpintaria, que oferecem poucas oportunidade às mulheres.
“O sector privado israelita está quase totalmente fechado ás mulheres árabes devido a práticas discriminatórias dos empregadores que preferem dar emprego a judeus”, disse Mr. Jabareen. Disse ainda que o governo falhou em dar o exemplo: entre os trabalhadores governamentais, menos de 2% são mulheres árabes, apesar de vários ministros pedirem o aumento de emprego para os árabes.

A Sra Sukha sublinha: “ O serviço público é um grande empregador, mas muitos desses trabalhos ficam no centro da cidade, em Tel-Aviv e em Jerusalém, muito longe do norte, onde vive a maioria dos cidadãos árabes.
Para além disso, a maior parte não pode viajar longas distâncias para encontrar trabalho devido à escassez no fornecimento de serviços de apoio às crianças. De 1600 centros de pré-escolar públicos existentes em todo o país só 25 estão junto das comunidades árabes. Shawshan Shukha também critica o ministério do comercio e da industria dizendo que apesar de este investir muito na educação das mulheres judias só 6% das mulheres árabes frequentam cursos, sobretudo os de costura e secretariado.

Jabareen disse que de acordo com este inquérito, 56% das mulheres árabes desempregadas queria trabalhar imediatamente. “Desde 1948 que os governos israelitas culpam as barreiras culturais impedindo as mulheres árabes trabalhar da sua pobreza, mas todas as investigações mostram que o argumento é absurdo” comentou. Há centenas de mulheres árabes que competem pelos trabalhos que aparecem no mercado”.

Acrescentou que os homens árabes também enfrentam discriminação, mas encontram trabalho porque preenchem a necessidade de trabalho pesado e manual que a maior parte dos judeus recusa fazer, e viajando ainda longas distâncias para os locais das obras.
“As mulheres nem sequer têm essa opção” ajuntou. “ Não podem fazer esse tipo de trabalho e precisam de ficar perto das suas comunidades porque têm responsabilidades nas suas casas”.

O urbanista disse ainda que em média as mulheres árabes em Israel têm mais anos de escolarização do que as dos países árabes vizinhos e do que no terceiro mundo. Há até mais mulheres árabes do que homens a estudar na universidade.
“Toda a investigação levada a cabo mostra que quanto mais educada é a população, mais fácil deveria ser encontrar emprego. O caso das mulheres árabes em Israel contraria estes dados. Constituem um caso único”.
Um estudo realizado pelo Banco de Israel e publicado no mês passado sugere razões adicionais para o nível de pobreza das famílias árabes. Mostra que os homens árabes são forçados a reformar-se por volta dos 40 anos, uma década antes dos trabalhadores judeus e dos trabalhadores europeus e americanos.
Os investigadores atribuem o desemprego dos homens árabes ao facto de que a maior parte executa apenas trabalhos físicos muito exigentes e também ao facto destes trabalhadores estarem a ser substituídos por trabalhadores oriundos do terceiro mundo, que recebem menos do que o salário mínimo.


Jonathan Cook é um escritor e jornalista que vive em Nazaré. O seu site é: www.jkcook.net.

(uma versão deste artigo foi originalmente publicada em The National)

fonte: Counterpunch

Monday, 30 November 2009

A Autoridade Palestiniana contra a libertação da Palestina e contra a solidariedade internacional

fonte:Somos Todos Palestinos e Al Ahram Weekly


A forma como a Autoridade Palestiniana (AP) se comportou em Genebra foi como o último prego no caixão da solidariedade internacional para com a causa palestiniana, no seu sentido mais usual.

3 de Novembro de 2009

Aqueles que tomaram esta decisão sabiam-no bem. A solidariedade internacional ficou confundida com as questões instigadas pelos Acordos de Oslo, um tratado firmado com a potência que exercia a ocupação antes mesmo de se avistar uma solução. Será que a luta pela libertação estava em progresso quando a ocupação estava ainda no terreno? Ou o processo de Oslo significou que a questão residia agora na capacidade dos "dois lados" chegarem a um acordo? Embora o movimento de solidariedade tenha feito lembrar um pouco a segunda Intifada, o desacordo dos palestinianos e o comportamento da AP em relação à guerra em Gaza lançou o acordo novamente para o meio da confusão. Mesmo assim, por mais fragmentadas e desordenadas que fossem, as organizações e movimentos militantes ou semi-militantes reuniram toda a energia que puderam para apoiar os palestinianos, mesmo divididos, no seguimento do ataque israelense a Gaza. O Relatório Goldstone foi o resultado deste dinamismo. Mas actualmente, após o dia 2 de Outubro em Genebra, quem vai mostrar solidariedade para com os palestinianos, como e por que razão o fariam?

O partido palestiniano que declarou em Genebra a retirada do seu apoio ao Relatório Goldstone agiu não como se os palestinianos precisassem de todo o apoio que pudessem reunir, mas como se fizesse parte da ordem internacional. Estavam junto com os da Casa Branca; por isso, quem precisa da solidariedade do povo quando é convidado do presidente dos EUA? Por outro lado, esse movimento de solidariedade pode, por vezes, ter efeitos negativos. O movimento apoia o povo de Gaza, por exemplo, enquanto as autoridades palestinianas em questão se encontram do outro lado do bloqueio, agindo no sentido de impedir qualquer esforço que possa ser vantajoso aos seus adversários políticos palestinianos. Estas autoridades disseram adeus ao movimento de libertação há já algum tempo. "Adeus, movimento de libertação", disseram, muito antes de este estar sequer nas previsões. Para quem tem olhos e ouvidos, esta é a dura realidade. Porém, o seu comportamento em Genebra foi um adeus definitivo e inequívoco ao espírito e à lógica da libertação e dos movimentos de solidariedade.

No meio das minudências das manobras políticas e dos rodeios em relação ao processo dos colonatos que dominavam os noticiários, perdeu-se não só o todo, mas também a essência da causa palestiniana. Este é precisamente o problema que os meios de comunicação social, que se pautam pela objectividade, deviam ultrapassar.

A arena internacional da era Obama fervilha em acções políticas mais direccionadas a dar o pontapé de saída no processo de paz do que em chegar a um acordo justo de paz. É provável que venhamos a assistir a uma conferência de paz no prazo de três meses, que trará de volta as "glórias" dos acordos de Camp David II, embora sem Arafat (que se recusou a abrir mão de Jerusalém), mas com Netanyahu. Mas nesse caso, poderemos confiar no segundo para recusar as mesmas propostas que Arafat rejeitou e, porque é um israelense extremamente patriótico, podemos até esperar mais do que isso. Também não devemos esperar que a administração actual em Washington se afaste das regras estabelecidas pelos seus antecessores para o suposto processo de paz. A administração Obama poderá ser o resultado do fracasso das políticas neoconservadoras, até ao ponto de se ver forçada a abandonar a exportação da democracia e reconhecer o fracasso da aventura no Iraque. Contudo, a situação dos estados árabes é tal que estes não podem tirar partido das fraquezas desta administração na área da política externa. Mesmo que fossem capazes, os governos do "eixo moderado" não estão interessados em entrar numa disputa por causa da Palestina, pois andam deliciados com a chegada de uma administração que abandonou a retórica da disseminação da democracia e dos direitos humanos.

Aparentemente, algumas autoridades árabes viram aqui uma oportunidade de "pressionar" Washington no sentido de não insistirem para que Israel pare a expansão dos colonatos e se concentre, pelo contrário, em reabrir as negociações para uma solução duradoura, com o pretexto de que a questão dos colonatos se resolveria, em todo o caso, nesta conjuntura. Mas mesmo no Iraque, onde a política externa dos EUA mais fraqueja, a ordem árabe instituída não conseguiu transformar esta debilidade (que é o produto dos empreendimentos alcançados pela resistência árabe) numa política que assegurasse a prioridade dos seus interesses e causas na agenda negocial entre os EUA, o Irão e a Turquia. Por isso, no que diz respeito à pressão norte-americana sobre Israel, Washington está aprisionada aos velhos hábitos. O cerne da mediação diplomática de George Mitchell, enviado norte-americano ao Médio Oriente, pode resumir-se em três pontos: convencer os árabes a adoptar iniciativas benevolentes na normalização das relações com Israel, assegurar a ajuda árabe no financiamento da AP, que é principalmente apoiada pela Europa; e garantir que os árabes estejam oficial e solidamente contra os que governam em Gaza.

Apesar de todas estas movimentações, a administração Obama espera terminar aquilo que as administrações de Clinton e Bush não conseguiram, na tentativa de convencer Israel e o mundo árabe a transformar o estado palestiniano proposto num "pacote negocial" completo. O "pacote", neste caso, é a fundação de um estado palestiniano em troca da renúncia dos árabes, primeiro, ao direito de regresso dos refugiados palestinianos e, segundo, da abdicação do desejo de que Israel abandone todos os territórios que ocupou desde Junho de 1967, incluindo Jerusalém Oriental. Para os árabes, a conclusão deste acordo significaria não só abandonar a causa palestiniana tal qual a entendemos historicamente, mas também abandonar o ponto de partida das suas iniciativas de paz. Israel, por seu lado, tem abraçado esta causa desde Sharon. Tem concentrado esforços em reduzir o estado proposto à mais pequena faixa de território possível e com o mínimo de direitos de soberania. Para que tal aconteça, Israel está a tirar vantagem da renúncia por parte da AP e da ordem árabe oficial a todos os instrumentos de gestão de conflitos, para além do seu formato de negociações para impor uma paz " de facto " no terreno (onde o nível e condições de vida do povo, incluindo bloqueios nas estradas e coisas do género, são as prioridades), e está a tirar igualmente partido da ideia dos dois estados para forçar os árabes a reconhecer a natureza judaica de Israel, o que implicitamente envolve a renúncia ao direito de regressar, a aceitação retroactiva do sionismo e também do facto de que Israel tem estado histórica e moralmente certo, enquanto os árabes têm estado histórica e moralmente errados.

Entretanto, a nova administração norte-americana começou a exigir uma paragem na expansão dos colonatos israelenses. Os árabes, incluindo os palestinianos, reiteraram a exigência. Aqui seria talvez útil recordar que na história da construção dos colonatos, as épocas em que esta foi mais rápida foram aquelas em que foi anunciado publicamente uma paragem na construção. Qualquer pessoa que conheça Israel e a forma como opera, sabe que a planificação e a construção são uma actividade central deste estado, que foi fundado com base em planos e construções. Israel planeia com um avanço de 20 anos. Qualquer paragem que dispense projectos de construção, para os quais já existiam planos, dá azo a que a construção continue por mais 20 anos.

Seja como for, o actual governo israelense nem sequer teria coragem de parar oficialmente porque este governo, ao contrário do seu antecessor, confia nas forças políticas que afirmam que a mera proclamação de uma paragem, por mais fraudulenta que seja, é um compromisso moral. Israel, na opinião dos extremistas de direita, tem de declarar oficialmente a sua legitimidade em expandir os colonatos, em vez de o fazer de forma dissimulada. Em Israel, o debate não se tem centrado na paragem (uma vez que realmente nunca houve uma), mas sobre se o estado deve ou não proclamá-la. Mas é de lamentar que os meios de comunicação social árabes entrem no jogo e, consequentemente, mantenham os árabes concentrados nas particularidades deste debate, pois isto oculta o facto de que a construção prossegue actualmente a todo o gás, especialmente em Jerusalém, e que o bloqueio a Gaza continua tão apertado quanto antes, sendo apenas uma ligeira variação da guerra de Dezembro/Janeiro.

Regressemos à questão fundamental, cuja implementação colide com as ambições de Israel: e então, o que é feito do direito a regressar? Acima de tudo, convém realçar que esse direito não emana de uma resolução internacional e que o povo palestiniano e árabe não abdicam deste direito, mesmo sem uma resolução que lhes dê aprovação oficial, se bem que, na verdade, essa resolução exista. É impossível recuperar o direito a regressar através de um acordo com Israel. Isso só poderá acontecer pela derrota de Israel no contexto do conflito entre árabes e sionistas. Por isso, se os árabes desistirem do conflito ou da estratégia de luta, então, estarão efectivamente a renunciar ao direito de regressar. Mesmo que a Organização para a Libertação da Palestina existisse enquanto organização militante, e mesmo que a AP fosse uma autoridade que operasse em conformidade com a lógica de libertação, os árabes não conseguiriam recuperar o direito a regressar na mesa de negociações com Israel, pelo simples facto de que Israel considera este direito como uma negação do seu próprio estado. Talvez por isso, muitos árabes se tenham afastado da retórica de recuperar este direito pela vitória sobre Israel e da retórica da recusa em naturalizar os refugiados palestinianos no contexto do processo de negociação. Para além disso, como se viu na prática, a rejeição da naturalização significou, na maioria dos casos, um "não à naturalização neste país, embora se outros países lhes quiserem dar direito de cidadania, é lá com eles".

De facto, esta posição é racista e, tal como o sectarismo e faccionismo, inserir-se na filiação numa única identidade árabe. A rejeição do conceito de naturalização em países que mantêm relações de paz com Israel e cujos acordos não incluem o princípio do direito a regressar, e nos países que contam com um eventual acordo de paz para recuperarem os territórios que Israel ocupou em 1967 e nos anos seguintes, não acarreta o direito de regresso. Será que estes países consideram que o assunto deve ser deixado para o governo de Abbas-Fayyad? Certamente que não, pois na prática a AP renunciou há muito tempo ao direito de regresso e mesmo que não o tivesse feito, não poderia impor esse direito no contexto da sua relação com Israel. Então, todos estes países encaram o direito de regresso como um assunto a ser abordado não entre eles e Israel, mas sim entre os palestinianos residentes nestes países e Israel. O único resultado lógico seria incentivar o racismo contra os refugiados palestinianos nestes países, o que estaria em conformidade com a disseminação de mentalidades sectárias, provincianas e tribais na cultura política das sociedades árabes e dos seus regimes vigentes.

Como é que a criação de um estado palestiniano poderá ser um pacote negocial? Chegados a este ponto, temos de entrar no reino da imaginação árabe e norte-americana, independentemente da posição israelense. Na imaginação de Washington, os ditames do realismo levarão os árabes a aceitar uma troca de território em vez de ser Israel a voltar às suas fronteiras de 1967. Acreditam ainda que "soluções criativas" para os locais sagrados resolverão o problema de Jerusalém sem que Israel tenha de se retirar da zona árabe da cidade. No que diz respeito à questão dos refugiados, esta resolver-se-á automaticamente por si só pela mera existência de um estado, que transformará os refugiados em cidadãos palestinianos residentes no estrangeiro com passaporte palestiniano. Segundo esta imaginação pragmática, embora muitos problemas fiquem pendentes, o estatuto legal dos refugiados resolver-se-á sem necessidade de regresso ou naturalização.

Este é actualmente o desafio. A indignidade que se desvenda em Genebra e Nova Iorque possui servos ávidos para os quais, mais do que nunca, os fins justificam os meios. Estes servos acreditam ser uma parte integrante da ordem internacional. Já não estão do lado de fora, como militantes revolucionários. Nem estão nas margens, como Arafat durante as Intifadas e no período após Oslo. E apesar da sua mera filiação na ordem internacional, eles imaginam que irão ter sucesso na sua busca por um estado. Encontramos aqui a fonte do desprezo por aquilo que os movimentos de libertação geralmente consideram como o centro da sua missão, ou seja, mobilizar o mundo contra os crimes da ocupação estrangeira na esperança de pelo menos refrear a mão do país que exerce a ocupação. Encontramos também um motivo para abandonar a própria ideia de conflito com a nação colonialista. Eles vêem-se a si próprios como pares hipotéticos desse estado, o que lhes dá o direito de usar os mesmos termos e a mesma linguagem pragmática, e de diminuir os apelos de justiça e respeito pelos direitos humanos, como fizeram escandalosamente quando votaram o Relatório Goldstone em Genebra.

Estão financeiramente corrompidos, colaboram em questões de segurança com a potência invasora, estabelecem uma entidade de governo repressivo com uma milícia para arrancar a própria noção de "solidariedade" da mente das pessoas e tomam parte num bloqueio económico cruel contra um grande número de concidadãos palestinianos. Estão, de facto, a agir de acordo com a natureza e espírito de uma ordem internacional que mente sobre crimes de guerra. Não vale sequer a pena tentarmos explicar as nossas razões a pessoas assim porque elas dir-nos-ão que estavam lá, que amadureceram e nós somos ingénuos. Pertencem a uma geração que teve um movimento de libertação, mas infectaram-no com a sua própria decadência antes que o movimento pudesse resultar num estado. Neste aspecto, deram provas de que não têm rivais.

Azmi Bishara
Al-Ahram Weekly, No. 968, 15-21/Outubro/2009

Friday, 27 November 2009

Recensão do livro: “A Palestinian century in a poet's life”


Recensão do livro: “A Palestinian century in a poet's life”



My Happiness Bears No Relation to Happiness tem como título secundário “Vida de um poeta no século palestiniano. Mas para melhor se entender a biografia do poeta palestinano Taha Muhammad Ali redigida por Adina Hoffman, é quase preferível dizer: “Um século palestiniano na vida de um poeta”. Esta escorregadela sintáctica não pretende desacreditar o trabalho de Hoffman, já que, ao empilhar no topo das empoeiradas pedras da história uma série de lembranças fluidas, a obra de Hoffmann constitui um marco literário. Porque é a primeira biografia de um escritor palestiniano escrita em língua inglesa. Porque oferece uma biografia que evoca a Palestina anterior a 1948.
O elenco de lugares desaparecidos começa com a vila de Saffurriyya, plantada no cimo de uma colina na Galileia. A infância de Ali passada nesse espaço foi difícil mas idílica. O seu pai foi atingido pela poliomielite e tornou-se por isso incapaz de trabalhar, o que levou a família a viver na pobreza. Ali, nascido em 1931, frequentou a escola apenas por 4 anos, antes de começar a trabalhar para o sustento dos pais e família. Na altura em que devia estar a aprender matemática, Ali trabalhava como negociante, vendendo ovos em Haifa.

Por fim, Ali, um empresário inteligente, passou a gerir um quiosque na sua casa de família. Construiu assim um pequeno mas activo negócio, mas de olhos postos na sua noiva, Amira, que lhe fora prometida desde o nascimento, e cujo riso e porte gracioso, escreve Hoffman, “tinham entrado na sua corrente sanguínea tão profundamente que ela parecia quase fazer parte dele.”
A presença de Amira, juntamente com a suave Galileia, amaciou os duros contornos dos primeiros tempos da vida de Ali. A paisagem mais tarde evocada pela sua poesia e recreada no livro de Hoffman, vibra com vida e parece de certo modo diferente, quase mágico, do mundo circundante. Hoffman escreve:
“Os próprios espinhos pareciam ali emanar um odor doce, e apesar de não conseguir saber que perfume pertencia a cada uma das plantas, ou explicar como se apercebia da diferença entre a fragrância de um arbusto de Nazaré e a de um arbusto cujas raízes mergulhavam no solo de Saffuriyya, o rapaz estava convencido que, fiando-se no seu nariz, sabia perfeitamente quando passara a orla [da sua aldeia]…”
Saffuriyya estava situada numa terra fértil que rendia colinas de frutas, incluindo, as romãs mais procurada de toda a Galileia. Saffurriyya era uma “aldeia do Corão, de contos épicos e de heróis de tonalidades damasquinas ou cairotas”. E acima de tudo, Saffurriyya era um fio que prendia Ali e da sua família ao tecido da Palestina.

Mas o pano foi rasgado numa noite de Julho de 1948 quando as forças israelitas bombardearam a aldeia. Ali e a sua familia fugiram para o Libano. Ai, o jovem Ali furtava bens num campo de refugiados até à primavera de 49, quando ele e a sua familia regressaram ao recém baptizado Israel. Depois de passarem furtivamente a fronteira a coberto da noite, estabeleceram-se em Nazaré, a menos de 10 kms dos vestígios da sua aldeia. Ali abriu o quiosque que mais tarde se tranformou numa das duas lojas de recordações que hoje possui.

Apesar da sua carreira como poeta ter começado tarde, a loja de Ali em Nazaré era ponto de encontro de importantes figuras literárias palestinianas, incluindo Michel Haddad. Neste ponto, o livro torna-se, segundo Hoffman “numa espécie de retrato de grupo”. Hoffman explica: “Taha não é o único artista nesta história. Para entender Taha e o seu lugar nas letras palestinianas e árabes, é fundamental ter a consciência do tipo de personalidades com quem foi contactando ao longo dos anos”.

Muito embora o leitor possa perder ocasionalmente Ali de vista em My Happiness, este livro compele-o a procurar a sua poesia, que está disponível traduzida para inglês e compilada numa antologia intitulada: So What: New and Selected Poems 1971-2005 (tradução de Peter Cole, Yahya Hijazi and Gabriel Levin)


This land is a whore
Our land makes love to the sailors
and strips naked before the newcomers ...
there seems to be nothing that would bind it to us,
and I -- if not for the lock of your hair,
auburn as the nectar of carob ...
Your braid
is the only thing
linking me, like a noose, to this whore.


Esta terra é prostituta
Estende a mão aos anos… holding out a hand to the years ...

A nossa terra ama os marinheiros
E despe-se perante os recém-chegados…
Parece não haver nada que a ela nos una
E eu – não fora a madeixa do teu cabelo,
Avermelhada como o néctar da Alfarroba
A tua trança
É o que me liga, como um nó, a esta prostituta.



Neste poema, o cabelo acorrenta o narrador a uma terra que o irá trair e sufocar. Mas em “O lugar ou Espero que não possas digeri-lo” também publicado na antologia, a imagem do cabelo ganha outro sentido, desta vez como algo reconfortante:


E vim então a O Lugar
Onde estão as ovelhas balindo
E as romãs da noite
O cheiro do pão
E o tetraz?
Onde estão as janelas
E a tranquilidade da trança de Amira?

Quer na Antologia poética de Ali, quer na biografia de Hoffman (que o Booklist considera como uma das melhores biografias de 2009), a profunda e complexa relação de Ali com a terra é posta em evidência. Hoffman tem o cuidado de explicar as circunstâncias históricas de onde nasce esta ambivalência. My Happiness Bears No Relation to Happiness deve ser considerada como um complemento fundamental embora não um substituto para a obra de Ali. Do mesmo modo que há uma sintonia entre os poemas de Ali, também a obra de Hoffman convive harmoniosamente com a escrita de Ali, com a sua vida e com o seu tempo.
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Mya Guarnieri é uma jornalista e escritora baseada em Tel-Aviv e que contribui regular para o Jerusalem Post. O seu trabalho também comparece no Outlook india, no The National, no the Forward, Maan News Agency, Common Ground News Service, Zeek, The Khaleej Times, Daily News Egypt e em outras publicações internacionais.

Fonte: The Electronic Intifada, 20 Novembro 2009

Tuesday, 24 November 2009

Como Israel Ganhou a Batalha dos Colonatos... Outra Vez.

fonte:Palestine Chronicle


Como Israel Ganhou a Batalha dos Colonatos... Outra Vez.

Por Ramzy Baroud

tradução: Ana Sofia Gomes, equipa Todos Por Gaza.

Quando o Ministro dos Negócios Estrangeiros, David Miliband, proferiu algumas palavras sobre a ilegalidade dos colonatos israelitas na Cisjordânia ocupada, muitos quiserem acreditar que Londres estaria a tomar uma dura atitude para com as continuas violações do direito international por parte de Israel. Infelizmente, estavam errados.
O facto é que a declaração de Miliband, feita durante a conferência de imprensa que se seguiu às conversações com o rei da Jordânia, Abdullah II em Amã, foram meramente tácticas, dirigidas de forma a diminuir o impacto da fraca posição assumida por Washington sobre o mesmo assunto,
Isto foi o que Miliband disse: “Os colonatos são ilegais e, do nosso ponto de vista, são um obstáculo ao estabelecimento da paz na Cisjordânia e em Jerusalém Orientar. Os colonatos desafiam o coração de... um Estado palestiniano.”
De seguida acrescentou: “É tão importante para aqueles que se interessam pela segurança e pela justiça social nesta região que as discussões sobre fronteiras e território recomecem de forma séria, porque se se conseguir fazer progressos nestas questões, pode resolver-se o problema dos colonatos.”
Isto é clássico de Miliband. Embora as suas afimações claras e decisivas acerca da ilegalidade dos colonatos e o facto de estes constituirem um obsctáculo à paz sejam bem-vindas, não é possível decifrar declarações de políticos sobre detalhes; para serem verdadeiramente apreciados, têm de ser compreendidos como um todo.
O perigo reside na afirmação seguinte na qual ele mudou propositadamente a ordem da solução proposta para a crise do Médio Oriente para centrá-la “na retoma das discussões sobre fronteiras e território de forma séria”, o que significa negociações sem condições porque “o progresso” nessa vertente “iria resolver o problema dos colonatos”.
Mas não é precisamente este o tipo de diálogo que Israel deseja tomar parte: conversações de paz sem condicionantes, sem prazos, sem um fim determinado, enquanto persiste na construção de colonatos ilegais constituindo uma violação flagrante do direito internacional? Mais, não foi isto que os palestinianos, todos os palestinianos, rejeitaram veementemente?
A liderança palestiniana percebe que negociações incondicionais trará aos palestinianos, a parte mais franca em qualquer negociação, nada mais do que humilhação, enquanto que a parte forte determinará a solução, qualquer solução, que achar adequada aos seus interesses.
Tendo em conta que Israel não está sob uma pressão séria, apenas sob uns discursos verbais sobre o processo de paz proferidos ocasionalmente or Washington e Londres, o governo de direita de Benjamin Netanyahu não tem razão para parar ou até abrandar os seus projectos de colonatos ilegais e a consequente limpeza étnica dos palestinianos.
Miliband é um político esperto. Não obstante as suas palavras federem a constradições, estão dispostas de tal maneira que dão a impressão que está a construir-se um mudança significativa nas políticas.
As declarações supostamente fortes de Miliband acerca dos colonatos surgiram numa altura em que a política da administração Obama, uma pequena tentativa de se apresentar como a antítese o legado odiado de George Bush, está a desfazer-se.
Em Maio, no seguimento do primeiro encontro entre Obama e Netanyahu, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, quis não deixar dúvidas sobre as novas políticas americanas acerca dos colonatos. Os EUA “querem que os colonatos parem – não alguns colonatos, nem postos avançados, nem excpeções de crescimento natural.”
Isto soa muito bem, melhor que as afirmações de Miliband. Mas desde então, a administração Obama obviamente descobriu os limites da “audácia da esperança”: um lóbi israelita forte, unido; um gorveno de direita israelita decisivo; países árabes e muçulmanos fragmentados e tudo o resto.
Portanto, não foi uma surpresa ver a senhora Clinton, durante a sua recente visita ao Médio Oriente, retroceder em todas as promessas que o seu governo fez. Segundo o Times (de 1 de Novembro), ela “alegou que a construção de colonatos nunca foi um pre-condição para retomar as conversações.”
Pior, não apenas falhou em convencer Netanyahu da posição dos EUA, que mais ou menos consitente com o direito internacional, como elogiou-o por falhar na concretização daquilo que foi considerado como uma forte exigência norte-americana.
A mudança aconteceu durante a sua visita de um dia a Jerusalém. “Aquilo que o primeiro-ministro (de Israel) tem oferecido em termos de restrições às políticas dos colonatos... não tem precedentes,” disse ela sobre a promessa de Netanyahu para abrandar a expansão de colonatos na Cisjordânia.
Há mais de 500 mil colonos judeus na Cisjordânia e Jerusalém ocupados que vivem em vários colonatos que são considerados ilegais de acordo com a IV Convenção de Genebra e numerosas resoluções das Nações Unidas
Para acrescentar o insulto, a senhora Clinton continuou, em casa paragem, a exigir aos árabes e aos muçulmanos que estendam a sua mão e Israel. Que é que este fez para merecer uma normalização com os árabes e muçulmanos, mercados abertos e o estabelecimento de relações diplomáticas? Por que é que Israel deve ser compensado pelos seus massacres em Gaza, pela sua ocupação militar da Cisjordânia e Jerusalém Oriental, pelos contínuos ataques à Mesquita al-Aqsa e outras?
Simultaneamente, a Autoridade Palestiniana estará talvez a aperceber o erro que cometeu ao confiar que a determinação da administração Obama prevaleceria sobre a obstinação de Israel.
O alto representante da AP, Nablil Abu Rudeinah, afirmou que “as negociações estão em estado paralítico,” cupando tanto “a intransigência israelita como o retrocesso americano.”
“Não há esperança para futuras negociações,” Abu Rudienah acrescentou.
Contudo, as palavras de chefe das negociações palestiniano, Saeb Erekat, na conferência de imprensa em Ramallah no dia 4 de Novembro, foram ainda mais pessimistas. Talvez seja a altura de o presidente palestiniano Mahmoud Abbas “dizer ao seu povo a verdade que devido à continuação da expansão dos colonatos, a solução de dois Estados já não é uma opção,” disse ele.
Ele disse o que muitos não querem ouvir, incluindo o próprio Miliband que insiste em manter viva uma 'solução' expirada enque nada faz para a tornar realidade.
“É importante que não percamos de vista a importância da solução de dois Estados para todos os povos da região. Penso que as alternativas são obscuras e mal-vindas por todas as partes,” declarou Miliband.
Todavia, ele falhou em demonstrar-nos como é que a sua solução 'brilhante e bem-vinda' vai ser concretizada à medida que Israel continua a capturar Jerusalém e a Cisjordânia centímetro por centímetro, à vista dos media internacionais e com o conhecimento e com o acordo tácito dos políticos em regredir, incluindo a senhora Clinton e ele próprio.

Sunday, 22 November 2009

O Ocaso do Estado de Israel

fonte:Al Jazeera (English)


O Ocaso do Estado de Israel
Por As'ad AbuKhalil

tradução: Ana Cecilia Fonseca, equipa TPG,



Actualmente, Israel enfrenta um conjunto particular de circunstâncias passados 60 anos de ter sido fundada no seio de uma nação já existente.
Foram acumulados um enorme arsenal de armas de destruição em massa e um aparato militar impressionante (principalmente através de apoios externos, primeiro da França e depois dos E.U.A). Também teve sucesso contra os regimes árabes nas guerras sucessivas.
No entanto, Israel ainda enfrenta muitos desafios a nível político e até a nível existencial. Um estado que foi arrogantemente declarado como uma “luz para as nações”, tornou-se um símbolo de agressão, de crimes de guerra e de discriminação ética e religiosa.
Um estado que procurou o apoio dos E.U.A. para manter a sua superioridade militar em relação aos regimes árabes, foi humilhado no campo de batalha no sul do Líbano, em 2006, por centenas de jovens armados.
Um estado que se gabou durante décadas sobre as suas competências e superioridade derivados dos seus serviços de inteligência, assistiu a uma tentativa de assassinato de Khaled Mishaal, o líder do Hamas, e um sequestro de um agricultor libanês, em 2006, porque o seu nome era Hassan Nasrallah (e levou a que especialistas israelitas demorassem alguns dias até descobrir que era o Hassan Nasrallah errado).
Um estado que assinou tratados de paz com vários regimes árabes e que mantém relações secretas com muitos outros, continua a ser odiado pelo público árabe e muçulmano.
Parece que, quanto mais se fortalece Israel mais esta se torna impotente para influenciar o seu estatuto na região.

Mudando a opinião pública

O relatório Goldstone só tem acrescentado problemas a Israel.
Inicialmente, Israel contou com os E.U.A. para encobrir os seus crimes de guerra, e os E.U.A. sempre avançaram para salvar Israel de qualquer condenação no domínio da ONU ou do congresso dos E.U.A.
Os E.U.A. usaram o seu poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas, muitas vezes por causa de Israel.
Há a presunção, por parte de Israel, principalmente desde a Guerra Fria, do eterno apoio do seu aliado norte-americano para continuar a escapar à perseguição internacional decorrente das acusações de crimes de guerra que é alvo, especialmente no seguimento da filosofia do Tribunal Penal Internacional (TPI).
No entanto, Israel tem a noção da evolução/mudança da opinião pública em todo a mundo a seu respeito. Até o Governo turco (um aliado-chave durante décadas) sentiu necessidade de se distanciar, devido, maioritariamente, a pressões públicas.
A opinião pública nos países europeus mudou a favor dos palestinianos, mesmo nos países – como a Alemanha, França, Holanda, Suécia e Dinamarca – onde o apoio fanático a Israel tem sido a política governamental durante décadas.
Os votos anuais em Israel exercidos na Assembleia Geral das Nações Unidas são bastante indiciadores. Ano após ano, Israel encontra-se num pequeno grupo que aglutina os E.U.A., as Ilhas Marshall e a Micronesia. O resto do mundo encontra-se no lado oposto, apesar da abstenção por parte de alguns aliados europeus dos E.U.A. devido ao receio de represálias.

Um erro de cálculo

Quando Israel procurou o auxílio dos E.U.A., a administração de Barack Obama, o presidente dos E.U.A., pensou que assunto seria simples.
Mahmoud Abbas, o Presidente palestiniano, não pode recusar nenhum pedido dirigido pelos E.U.A., por mais que a oferta seja humilhante. A exemplo disso, Abbas sucumbiu às pressões americanas e pediu ao seu embaixador em Genebra que concordasse com o arquivamento da discussão sobre o relatório Goldstone no Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
Os E.U.A. (e, ironicamente, o regime de Abbas) erraram o cálculo. Não se aperceberam de que existem limites para o que a circunscrição da Fatah poderia aceitar. Mas, já era tarde para reverter o curso das coisas: o governo israelita teve de optar entre a permissão entre a existência da discussão ou a perda da credibilidade – ou o que resta dela – do regime de Oslo em Ramallah.
E Israel enfrenta outros dilemas neste campo. Pode insistir que a natureza do relatório é tendenciosa, mas de momento não pode acusar o seu autor de anti-semita. Ou de acusar que o mesmo relatória manifesta simpatia pelo islão ou pelo fundamentalismo islâmico. O juiz, assim como a sua filha, informaram os media israelitas, é um sionista que se preocupa com Israel, mas as provas de crimes de guerra eram avassaladoras.
O governo israelita não se pode restringir aos clichés propagandísticos que foram praticados durante décadas com desrespeito pelos regulamentos e lei internacionais.
Desta vez, os E.U.A. não poderão salvar Israel porque muitos países assistiram, em primeira mão, a cenas de um bruto assalto a Gaza e à sua população civil.

Novo enquadramento moral:

Israel também sabe que está a emergir um novo enquadramento moral, um enquadramento que gerou o TPI, tão fraco como ainda é.

A capacidade de Israel de encetar guerras e invasões sem qualquer consideração pela lei internacional ou simples moralidade, irá ser restringida com o decorrer do tempo, mesmo que o apoio os EUA se mantenha constante.

A UE avançou a possibilidade de intervenção internacional em nome de uma moralidade internacional em casos em que se sucedam crimes de guerra, em particular se ocorrerem de forma padronizada durante um certo período de tempo.

É possível que a brutalidade dos ataques Israelitas ao Líbano em 2006 e em Gaza em 2008, poderão ser mais difíceis de repetir no futuro, e que irá apenas aprofundar o predicado de Israel - um Estado que tem operado com base na premissa de que apenas com força bruta se podem resolver todos os seus problemas.

Israel reivindica (tal como os EUA) que nenhuma organização internacional tem o direito de investigar, acusar ou julgar a sua conduta bélica porque é uma "democracia".

Esse argumento parece fraco ao momento, não só porque o racismo do Estado Israelita (manifestado a tantos níveis do governo e do discurso oficial) se tornou mais conhecido, mas também porque a conduta bélica Israelita é indistinta das praticadas pelos regimes mais brutais. Israel também não possui um passado de investigações internas credíveis sobre o comportamento das suas forças armadas.

Dos campos de batalha para os tribunais

É improvável que a derrota do projecto sionista se venha a suceder da forma que os Árabes desejam há décadas. No entanto, é possível que - especialmente se os EUA perderam a supremacia internacional - Israel poderá ser forçada a reconhecer as aspirações políticas Palestinianas fundamentais, e até o direito a voltar, eventualmente, por ordem da comunidade internacional.

As opções Israelitas, além de violentas invasões e bombardeamentos, são deveras limitadas.

A ironia do Estado de Israel é que a sua influência não cresceu à medida da sua capacidade militar e o seu poderio militar nem sequer conseguiu fazer um "risco" na popular rejeição de Israel, como questão de princípio, na região.

Claramente, os Árabes - a nível popular senão de regime - não foram levados a aceitar os ditos Israelistas e a criação dos "factos no terreno".

É possível que a próxima fase do conflito Israelo-Árabe se possa transferir do campo de batalha para organizações e tribunais internacionais. Em tal cenário, a superioridade militar Israelita é deveras obsoleta.

As'ad AbuKhalil é um professor de ciências políticas na Universidade Estadual da Califórnia, Stanislau, e autor do blog Angry Arab.

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