(Texto publicado em 22 de Agosto de 2009)
O MEU primeiro pensamento foi: Meu Deus, esse homem foi o responsável pela vida dos nossos soldados!
O segundo pensamento foi: Qual é a grande surpresa? Sempre soubeste o tipo de pessoa que ele era! Afinal, durante os seus anos como chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, apoiou discretamente, a criação de postos avançados “ilegais" de colonatos por toda a Cisjordânia!
O terceiro pensamento: E esta pessoa é agora vice-primeiro-ministro e membro do "Sexteto" - os seis ministros que constituem o verdadeiro governo de Israel.
A OCASIÃO para estes pensamentos assustadores foi a participação de Moshe ("Bogie") Ya'alon numa reunião da Jewish Leadership Faction [uma facção de extrema direita dentro do partido Likud]., onde afirmou:
"O “Paz Agora” é um vírus", e não só eles. "Todos os meios de comunicação social" são também um vírus. Eles influenciam o discurso público "de uma forma distorcida, de uma forma enganadora". O vírus também inclui a "elite" em geral.
Além disso, os “políticos" são os culpados. "De cada vez que os políticos trazem a pomba da paz, nós, o exército, temos que limpar depois disso."
Resumindo: "Os judeus têm o direito de residir em qualquer lugar e por todo o Eretz Israel." E se isso perturba os americanos, Ya'alon tem uma resposta pronta: "Não tenho medo dos americanos!"
Tudo isso foi dito alguns dias depois de Ya'alon ter feito uma visita bem divulgado pelos territórios ocupados, acompanhado pelo líder do Shas, Eli Yishai e vários outros ministros de extrema-direita.
Este grupo visitou os postos avançados dos colonatos, que o governo israelita prometera desmantelar, aos norte-americanos, há muito tempo e manifestou total oposição à sua evacuação.
Eles concluíram a sua visita em Homesh, o colonato da Cisjordânia evacuado por Ariel Sharon, no decurso da “separação " onde Ya'alon exigiu a reinstalação do colonato.
ESTES SONS compõem numa melodia assustadora, uma melodia que conhecemos muito bem. É o hino do fascismo.
Primeiro: o termo "elite". No jargão da extrema-direita israelita, isso inclui todos aqueles que odeiam: os intelectuais, as universidades, os políticos liberais, o Supremo Tribunal, os meios de comunicação.
O termo tem suas raízes no verbo latino "eligere", escolher, o que significa o melhor, o seleccionado. Como esta é uma matéria indefinida, o termo pode ser aplicado a diferentes alvos.
Quando os demagogos se dirigem às massas judaicas orientais, "a elite" claramente consiste nos Ashkenazis que governam o país.
Ao abordar a comunidade religiosa, "a elite" consiste no secular, no ateu, que são estranhos à Tradição Judaica.
Ao abordar os imigrantes russos, "a elite" consiste nos israelitas já de idade e estabelecidos, os nativos, que obstruem o caminho dos novos imigrantes.
Quando alguém junta tudo isto, surge uma imagem de "eles" e "nós".
"Eles" - um punhado de arrogantes veteranos, que ocupam todas as posições-chave no estado, e "nós" - as pessoas simples, honestas, os patriotas, os guardiões da tradição, os discriminados, os oprimidos.
Cada grupo fascista no mundo considera esta visão da "elite".
(Não importa que Ya'alon, como a maioria dos outros demagogos, pertença, ele próprio, à elite. Ele nasceu no país, um Ashkenazi de ascendência ucraniana. O seu nome original era Smilansky. Ainda é oficialmente um dos membro de um "kibutz” elitista e pertence ao super-privilegiado corpo dos oficiais superiores.)
Segundo: Os traidores. Existe um inimigo interno. Que não é menos perigoso do que um inimigo estrangeiro, na verdade, muito mais perigoso. Quando Ya'alon fala sobre o “Paz Agora”, ele abrange todo o campo da paz, os liberais e a parte secular da sociedade. Essa é a Quinta Coluna, o cavalo de Tróia dentro dos muros. Eles têm de ser eliminados, antes que se possa lutar contra o inimigo estrangeiro.
Terceiro: Os políticos ". Os demagogos são, naturalmente, eles próprios políticos, mas excluem-se. Ya'alon pinta um retrato dos "políticos" que trazem uma nojenta pomba da paz, cujos excrementos, o exército tem que limpar.
O velhaco, planeando, políticos covardes de um lado, o límpido, heróico, o exército fiel, do outro - que é uma imagem muito familiar.
O exemplo mais conhecido era corrente na Alemanha após a Primeira Guerra Mundial.
A lenda da "facada nas costas" foi um trampolim para o poder para Adolf Hitler: o exército alemão enfrentando corajosamente o inimigo e tendo a vitória à vista, quando "os políticos ", os judeus, os socialistas e os outros “criminosos de Novembro" [referência aos apoiantes da República de Weimar proclamada em 1918] enfiaram uma faca nas costas dos heróicos combatentes.
A pomba da paz deixa suas fezes e os soldados são obrigados a limpar a sujeira da paz.
E também: "Todos os meios de comunicação". Esta é uma das marcas do fascismo em Israel e por todo o mundo. A mídia é sempre "de esquerda", "anti-nacionalista", são os meios de comunicação "hostis". Os jornalistas e empresas de radiodifusão são uma liga secreta de detractores de Israel, que espalham mentiras e distorcem a realidade a fim de minar o moral nacional, difamar o exército, denegrir os nossos valores nacionais e dar conforto ao inimigo.
A realidade é, naturalmente, muito, muito diferente.
A mídia israelita repete servilmente a propaganda oficial em todas as questões nacionais e de segurança e é conformista ao mais elevado grau.
Não há um único jornal de esquerda no país. A maioria dos correspondentes políticos repetem como papagaios as declarações de "fontes oficiais", quase todos os correspondentes de assuntos árabes são ex-agentes dos serviços de informação do Exército, e quase todos os correspondentes militares servem como porta-vozes não-oficiais das Forças Armadas.
Nas páginas de notícias e nos programas de notícias, a terminologia direitista reina suprema. Mas porque em questões menos importantes os meios de comunicação criticam o governo, como eles têm o dever de o fazer numa sociedade democrática, é fácil de retratá-los como "de esquerda" e subversivos. O mesmo é verdade para a universidade.
E finalmente: O "vírus". A descrição dos adversários políticos como agentes infecciosos ou parasitas nojentos é uma das mais características distintivas da extrema-direita. É suficiente lembrar o filme do Dr. Joseph Goebbels "O judeu eterno", em que os judeus eram mostrados como ratos propagando da doença.
E se juntarmos todas estas características - o ódio à "elite", a glorificação do exército, o desprezo para com "os políticos", a demonização do campo da paz, a incitamento contra os meios de comunicação - é a feia cara do fascismo que emerge. Aqui em Israel e por todo o mundo.
NÃO MENOS importantes são o contexto e a audiência.
Ya'alon falou numa reunião da “Jewish Leadership Faction”.
Este é um grupo de ultra-ultra-direitistas, que entrou no Likud, com o objectivo declarado de o conquistar a partir de dentro. É dirigido por Moshe Feiglin e os seus seguidores são geralmente chamados de "Feiglins".
Na véspera das últimas eleições, Binyamin Netanyahu fez um esforço final, utilizando meios legítimos [kosher no original] e não-tão-kosher, para remover Feiglin da lista de candidatos do Likud. Ele estava determinado em evitar que o Likud, fosse apresentado como um partido de extrema-direita.
O principal concorrente do Likud, o Kadima, definia-se como um partido do centro ou da direita moderada e tentou a todo o custo empurrar Netanyahu para a direita. Netanyahu pensou que expulsando os Feiglins poderia neutralizar este ataque.
A questão é se este era o seu único objectivo. Se assim for, porquê que elevou Benny Begin, uma pessoa que personifica a extrema-direita, a um lugar de destaque na lista? E porquê que inscreveu [no Likud] e abraçou Moshe Ya'alon, que já era conhecido como uma pessoa com uma visão de extrema-direita? Esse abraço custou muito caro, uma vez que, no final, o Kadima, contra todas as expectativas, ganhou mais um lugar do que o Likud.
Mas Netanyahu, um político nato, tinha mais do que um objectivo em mente. Ele tinha medo que Feiglin poderia, um dia, vir a ameaçar a manutenção da sua liderança do Likud. Para evitar esta possibilidade, ele negou a Feiglin um assento no Knesset.
E aqui chega Ya'alon, o protegido mimado de Netanyahu, e junta-se a Feiglin, justamente a ele. Como diz o ditado hebraico, a andorinha foi visitar o corvo. Mas não está bem claro quem é a andorinha e que é o corvo. Está Feiglin a usar Ya'alon - ou é Ya'alon que pretende usar Feiglin, a fim de se posicionar como o líder de um grande campo da extrema-direita.
É PRECISO também prestar atenção a declaração de Ya'alon de que "eu não tenho medo dos americanos". Os americanos exigem o congelamento dos colonatos? Para o inferno com eles! Quem eles pensam que são? Que, esses Goyim [não-judeus] estão nos dando ordens? Barack Obama quer nos dizer onde podemos instalar e onde não podemos?
Essa é outra característica do fascismo israelita emergente: a disponibilidade para encetar um confronto aberto com os Estados Unidos e, especialmente, com o presidente Obama.
Já está em pleno andamento uma campanha israelita contra "Barack Saddam Hussein", o Novo Hitler.
A direita americana e a direita israelita facilmente encontram uma linguagem comum.
Uma mulher israelita nos E.U.A. está dirigindo uma campanha bem publicitada para provar que Obama não nasceu nos E.U.A., que o seu pai nunca foi um cidadão E.U.A., e que em consequência deve ser expulso da Casa Branca.
Tudo isto roça a loucura. Israel está dependente dos E.U.A. para praticamente tudo: assistência económica, armamento, cooperação nos serviços de informação, apoio diplomático, como o de veto no Conselho de Segurança. Netanyahu está tentando evitar um confronto, usando todos os truques para enganar e desviar as atenções. E aqui vem Ya'alon & Co. e apelam para uma revolta aberta contra o E.U.A.!
Há método nesta loucura. O sistema educacional israelita glorifica os zelotes, que há cerca de 1940 anos atrás declararam guerra ao Império Romano. Os zelotes tornaram-se os líderes da comunidade judaica na Palestina e iniciaram uma revolta que não teve nenhuma chance de sucesso. Os rebeldes foram derrotados, Jerusalém foi destruída e o Templo queimado até às fundações.
O SHOW DE HORRORES DE “BOGIE” tem implicações mais amplas.
Ele apresenta uma imagem de um grupo de extremistas loucos desafiando o moderado e responsável Netanyahu.
Netanyahu acena a Obama e ao seu povo: Help! Se me pressionam sobre o congelamento dos colonatos e o desmantelamento dos postos avançados, será o meu fim! O meu governo cairá, e terão de lidar com os malucos!
Isto seria mais convincente, se Netanyahu tivesse usado a sua prerrogativa legal e demitisse Ya'alon do governo, mesmo pensando que representava um risco político.
Em vez disso, "Bibi" convocou "Bogie", como um diretor que chama um menino e que lhe ordena que escreva uma centena de vezes "Eu vou ser um bom menino".
Assim Ya'alon permanece Vice-Primeiro-Ministro, Ministro Encarregado dos Assuntos Estratégicos e membro do sexteto de Ministros (os outros são Avigdor Lieberman, Benny Begin, Eli Yishai, Dan Meridor e Binyamin Netanyahu).